por Larissa Nakamura
Aproveitando o post da semana anterior, hoje trouxe um exemplo de uma iniciativa promovida por uma empresa privada, que busca a promoção da literatura no país e que também pode contribuir para a profissionalização do escritor. No mês passado, o Serviço Social do Comércio (SESC) deu início a um projeto chamado Arte da Palavra – Rede Sesc de Leituras que ao longo deste ano promoverá uma série de atividades em vários estados do país: bate-papos; oficinas literárias; slam poetry; saraus; performances; contação de histórias etc., contando com a participação de 91 escritores do todo o Brasil.
O SESC afirmou que a curadoria ocorreu de forma independente em cada unidade regional, embora os critérios precisos para a escolha não tenham sido divulgados. Nas lista, figuram nomes mais conhecidos como Rafael Gallo, Cintia Moscovich e Bráulio Tavares, vencedores de prêmios literários de grande renome nos últimos anos.
No rol de atividades, é possível notar uma preocupação com a formação de um público leitor e com o papel do escritor como agente cultural, pois a programação contempla diferentes formas de produção e atuação no campo da literatura. Uma delas envolve a leitura e discussão das obras dos autores convidados nas escolas antes das sessões de bate-papos com o público estudantil.
Talvez iniciativas como essa amenizem o que João Cezar de Castro Rocha considera como atitudes puramente performáticas dos autores, que deixam em segundo plano a discussão de suas próprias obras nos eventos literários de que participam. Castro aponta a necessidade de “criação e multiplicação não mais de ouvintes, porém de leitores […] Leitores críticos”. Parece-nos, então, que o crítico propõe uma reflexão sobre o significado da profissionalização do autor de literatura.
Acreditamos que o escritor, que atua também como um agente cultural, lançando mão de uma série de intervenções e estratégias, vem renovar, refazer e/ou a reafirmar constantemente as posições que ocupa no sistema literário, redimensionando-o, e incrementando também, por tabela, as possibilidades de sustento financeiro garantidas pelo ofício da escrita.
Henrique Rodrigues, técnico de literatura do departamento nacional do Sesc, afirmou recentemente em reportagem de O Globo:
“Temos um vício no meio literário de achar que, ao convidar um artista da palavra para participar de um evento ou publicar um livro, estamos fazendo um favor para ele. Essa é uma prestação de serviço que precisa ser remunerada. O autor está ali cedendo o seu tempo e reconhecimento. É preciso valorizar e remunerar. O artista é parte da cadeia produtiva.”
A declaração revela-se interessante por apontar um vínculo que é considerado um tabu no debate sobre profissionalização: o que envolve cifras. O campo literário sempre tratou como problemática a associação entre dinheiro e arte.
Tal rejeição ainda pode ser detectada no contemporâneo e sua persistência pode ser fruto da manutenção de uma imagem do escritor impregnada de um ideal romântico: o do escritor diletante que, por amor puro e desinteressado à arte, rejeita, às vezes apenas simbolicamente, os bens materiais que poderiam advir de sua produção, afirmando trabalhar por vocação ou por pura necessidade visceral. A persistência desse imaginário, inclusive entre os próprios autores, constitui um entrave para o pesquisador que quer analisar as condições da profissionalização do escritor nacional, principalmente porque julga-se de mau gosto tratar das condições de contratação de um agente literário ou tematizar os termos de contrato com uma editora. Embora saibamos que muitos autores hoje já conseguem “viver de sua pena”, ainda é muito difícil tematizar as condições concretas que permitem aos escritores usufruírem da sua condição de profissional das letras.
Para mais informações sobre o projeto, clique aqui: http://www.sesc.com.br/portal/noticias/cultura/literatura+por+toda+parte