Fanfiction e autorias fluidas

Por André Neves

Alguns estudiosos afirmam que os processos de produção das novas formas de produção do texto literário na rede rompem padrões tanto de forma quanto de conteúdo e, principalmente, modificam as formas de construção de autoria.

Podem-se pensar, dentre os exemplos para essa afirmação, nas produções de fanfiction e na negociação e colaboração autoral da wikipedia.

A wikipedia é uma enciclopédia livre online, redigida e editada por internautas de forma colaborativa, cujo texto se apresenta como resultado final, produto da negociação de vários colaboradores, não apenas de um único autor.

Por fanfction entende-se a “apropriação cultural”, ou cultura participatória da ficção de fã, cuja produção consiste na (re)escrita de histórias (contos, romances, etc). Os escritores das fanfictions podem se apropriar de histórias, personagens ou universos ficcionais que fazem parte de um enredo de um livro, filme, história em quadrinhos.

Em seu livro Fic, porque a Fanfiction está dominando o mundo, Anne Jamison, num capítulo instigante intitulado “Por que Fic?”, afirma que  os fic writers chamam a fic de “brincar na caixa de areia de outra pessoa” ou “pedir emprestados os brinquedos do vizinho”.  Contudo, independente do como se possa chamar o ato da (re)escrita de fã, a fic continua, reimagina, redefine histórias e propõe novos modelos de publicação, de forma, de conteúdo, de gêneros e de autoria.

A autoria pensada nos moldes do ficwriter faz com que a obra tenha as marcas não apenas do vizinho, mas também de quem o tomou de empréstimo, permitindo que o o “novo autor” possa sacudir a areia da caixa de outra pessoa. Isso implica em uma produto/obra que apresenta contornos imprecisos, calcado em um processo  potencialmente inacabado, passível de novas interações e intervenções por parte dos fãs- autores.

Quem é então esse autor? É possível se pensar em uma espécie de autoria coletiva, fluida e indeterminada para os textos de fãs?

Nesse contexto, é possível dizer que a grande contribuição da apropriação participativa, mais especificamente da fanfiction parece ter sido trazer novos contornos para a concepção de autoria no século XXI, pois desloca a autoria singular para uma autoria plural e fluida que se apresenta como uma nova potência transgressora.

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5 Respostas para “Fanfiction e autorias fluidas

  1. Descentralizar a autoria é um característica que vale destaque mesmo no Séc. XXI……….dá para acrescentar blogs e pequenos sites (além de pequenas editoras) que juntam escritores para escrita coletiva de romances ou contos a várias mãos………..talvez seja possível medir a influência da internet \ redes sociais nesse processo………….busca do individuo por reconhecimento, criação de reputação e por aí vai………………….pode-se até criar-se como hipótese que a leitura mudou, o sentido de fruir, ou o processo de aisthesis, poiesis e catarsis, como descrito por Jauss, esta mudando……………..

    • Concordo, Eder. Deslocar a autoria e colocá-la em rede (no sentido de descentralizar o lugar do autor) é uma necessidade também do campo teórico, uma vez que já há muito acontece na prática. É importante pensar também como isso afeta as teorias da recepção.

  2. Gostei do texto André. Muito legal essa ideia de pensar a fanfiction com a perspectiva de autoria coletiva, reuso, etc. Ansiosa por novos posts sobre o tema. Um abraço

  3. Obrigado, Débora.

    Sim, os modos de produção na contemporaneidade desloca teorias e consequentemente, as formas de pensar a obra como algo acabado e nos faz pensá-la como um continuum, como obra processo. Nessa perspectiva, o autor também se constitui no processo, de forma coletiva.

  4. Pingback: Literatura em colaboração? | Leituras contemporâneas - Narrativas do Século XXI

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