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Por Larissa Nakamura
Nos últimos anos, saltou aos olhos a quantidade de revistas, cadernos, suplementos de jornais que dedicavam, total ou parcialmente, seu conteúdo ao mundo das letras e que tiveram suas publicações encerradas. Alguns exemplos mais conhecidos são o caso do Prosa & Verso (jornal O Globo), o Sabático (jornal O Estado de São Paulo – Estadão) e a revista Bravo! (que após ter encerrado definitivamente suas atividades por três anos, volta a ser lançada somente em versão digital). Os mais pessimistas bradavam que era o fim do jornalismo cultural e da crítica literária, outros apostavam que era uma crise ou período de reconfiguração. Talvez esse seja o momento ideal para entender os processos e alterações por quais passa a crítica se voltarmos nossa atenção para o universo cibernético.
Se a crítica encontra-se escassa, embora ainda presente, nos meios tradicionais de comunicação, onde podemos encontrá-la de modo que possa alcançar diversos públicos, cada um com suas especificidades e interesses? No cenário em que despontam os blogs e, atualmente, com cada vez mais canais dedicados à literatura, o YouTube, poderíamos apostar em um novo espaço de circulação de literatura? Para muitos, o site já é considerado a nova televisão. Programas de culinária, música, análise de filmes, aulas de línguas e jogos são algumas das possibilidades que o serviço nos oferece. E por que não o comentário sobre literatura?
Tomemos como exemplo uma das booktubers mais conhecidas, Tatiana Feltrin dona do canal Tiny Little Things. Formada em Letras e professora de inglês, começou o canal falando de variedades, dedicando-se somente à literatura um pouco depois. Hoje, contabilizando mais de 200.000 assinantes no canal, os vídeos se dividem entre a literatura canônica e a comercial. Feltrin considera importante trazer para a discussão os dois universos sem que ambos sejam tratados de forma antagônica ou excessivamente hierarquizada, pois segundo a comentarista ambos possuem facetas diferenciadas, mas não menos relevantes para o mundo das letras.
O que é interessante, guardadas as devidas diferenças entre os canais existentes, é como lidam com o nicho de mercado específico com que se propõem trabalhar. Sobre tal quesito conta muito o como se comenta, o que pode garantir menos ou mais espectadores. O que diferenciaria, então, a crítica como disciplina formal do comentário sobre literatura na internet?
A meu ver, os que os booktubers fazem são bons comentários pessoais sobre livros, indicações atravessadas por falas mais dinâmicas e simplificadas, marcadas por um quê de expressionismo, deixando de lado os jargões mais técnicos, o que pode aproximá-las à antiga crítica de rodapé. No entanto, existem também aqueles que embora não possuam uma dicção propriamente acadêmica, baseiam seus comentários subjetivos em algumas noções de teoria da literatura, promovem e tencionam uma discussão sobre o livro escolhido, superando a mera postura opiniática.
Minha conclusão é que, a despeito de a crítica formal e o comentário na internet apresentarem alguns aspectos comuns, têm propostas diferentes, sem que haja perda de sua relevância para a comunidade leitora.
Talvez um dos maiores trunfos que o YouTube proporciona é a diminuição da sensação de distância entre o booktuber e o espectador, posto que o resenhista dificilmente assume a postura de um especialista quando compartilha sua opiniões com o público. Sendo assim, o leitor/espectador sente-se em uma “conversa” sobre o livro comentado em vídeo. O segundo trunfo, a meu ver, é a interatividade quase que imediata entre o resenhista e o espectador, que marca sua participação ativa na rede (muito frequentemente ocorrem votações e sugestões de temas e livros a serem discutidos, assim o booktuber cria suas pautas a partir do que o público deseja assistir). Um exemplo curioso que vale a pena ser citado são as playlists nas quais o youtuber reúne suas críticas de diversos livros indicados ao vestibular de diversas instituições de todo país. De fato, uma estratégia que visa a um público-alvo que se torna cativo.
Como último ponto, não podemos nos esquecer da relação estreita que os booktubers têm hoje com o mercado, considerando que uma parcela significativa deles é contratada por editoras grandes e pequenas para auxiliar no processo de marketing de obras recém-lançadas. Os critérios de escolha das casas editoriais são claros: variam de acordo com o número de assinantes do canal, sua faixa etária média, o estilo de crítica e tipo de literatura resenhada. Os booktubers também são assediados por escritores que publicam seus livros de forma independente e buscam a divulgação de suas obras.
As inovações promovidas pelas ferramentas da internet, como as utilizadas por booktubers, podem não ser indício da renovação de antigos moldes de conteúdo crítico, mas a criação de mais um espaço para a literatura é bem-vindo em um momento em que os canais tradicionais de circulação de conteúdo cultural estão em extinção.
Adorei o texto. De fato, tenho tido percepções semelhantes, mas, aqui, puder conhecer uma perspectiva mais elaborada sobre o assunto. Que bom que as pesquisas acadêmicas estão cada vez mais indo além dos muros universitários. Viva! 😉
Nil, fico feliz que tenha gostado do texto. Com certeza, é muito importante ir além da academia, ver o que anda circulando no nosso dia a dia e ainda assim propor uma reflexão.
Larissa parabéns pelo texto. Bem atualmente a internet tornou-se uma chave muito mais abrangente de informações do que aquela produzida pela imprensa tradicional. Se no passado buscava-se mais conhecimento sobre um livro ou determinado autor por meio de jornais e sobretudo, nos cadernos literários, hoje em dia ficou mais fácil para leitores acompanharem o que circula no mercado do livro. E o canal do Youtube citado aqui no seu post é um bom exemplo de plataforma que proporciona a divulgação de livros e autores. Bem você também citou no post a questão dos Booktubers, gostaria de saber se esses vídeos que os Booktubers postam no Youtube tem um público especifico de espectadores?
Oi, Neila.
Cada booktuber trabalha visando um público-alvo, então tem para todos os gostos, embora eu arrisque dizer que adolescentes e os jovens adultos são os que mais acessam tais canais.