Pesquisa: uma aventura autorreflexiva

Por Nívia Maria Santos Silva

Muitas vezes, em nossa ânsia por encontrar uma fundamentação teórica perfeita para nossos objetos de pesquisa, vemo-nos inclinados a aplicar em nossos estudos conceitos operatórios que se encaixam com as nossas necessidades científicas e, assim, acabamos por promover um uso automático e engessado de teorias as quais passamos a defender indiscutivelmente como se tivéssemos nelas uma crença quase sagrada, fazendo delas o porto seguro de nossas ideias, a fim de confirmar nossas conclusões, as quais, em ocasiões várias, são tomadas antes mesmo de o trabalho ter sido executado.

Tal procedimento, todavia, conduz a uma espécie de cegueira intelectual com a qual não conseguimos perceber que uma pesquisa não deve buscar apenas aquilo que nela parece se encaixar. Imprescindível é lembrar que os conceitos operatórios não são imutáveis nem insubstituíveis e as teorias não anunciam verdades absolutas. Por isso, não devem ser tratadas de forma doutrinária como se o que proferem fosse insuperável e nem os seus teóricos devem ser seguidos dogmaticamente e defendidos com fervor muito próximo ao religioso.

Não é a fé que deve conduzir o pesquisador, mas a visão crítica, a capacidade analítica e, obviamente, a pesquisa propriamente dita, que não se limita a levantar informações e obter conhecimentos, mas abarca, sobretudo, ter critérios para selecioná-los, filtrá-los, relacioná-los, reelaborá-los, até mesmo, mostrar-lhes as fragilidades e, por que não, dispensá-los parcial ou totalmente.

Essa postura crítica e reflexiva não é fácil e exige, especialmente, que o pesquisador saía da zona de conforto e perca um pouco (ou muito) de suas certezas, o que pode levá-lo a recuar, mas também a realizar um trabalho mais apurado e importante para comunidade acadêmica e a sociedade em geral.

Cabe ao pesquisador se apropriar sim, mas também refutar, reformular, criar e, dessa forma, fazer surgir novos pontos de vista. É assim que surgem novas teorias que, por sua vez, serão revisitadas e a partir delas gerados novos conhecimentos e conceitos. O exame da teoria escolhida pode, por si, mostrar fissuras que alargam as possibilidades de surgirem novos resultados, o que torna a pesquisa uma empresa extraordinária, imprevisível e fértil.

Essa conduta combativa é como a de um aventureiro prestes a se entregar a um feito perigoso e sem um fim previsível que, inclusive, pode deixar sequelas irreversíveis. Revisitar os conceitos operatórios que o dirigem e se lançar na empreitada de reexaminar a teoria escolhida para nortear seus estudos e estabelecer sua tese é aceitar esse desafio. Para tanto, o pesquisador tem que se jogar de parapente da encosta montanhosa e rígida na qual se apoiava e se deixar conduzir, autorreflexivamente, pelos ventos da seguinte questão: quais são os limites da fundamentação teórica que me orienta?

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