Arquivo do mês: fevereiro 2014

Muitas opiniões sobre a literatura contemporânea

Larissa Nakamura

Uma enquete recente publicada pela Folha de S. Paulo perguntou a importantes críticos literários, escritores e professores universitários acerca da cena literária contemporânea: as tendências mais visíveis, a relação entre literatura e política, a importância das oficinas literárias, o espaço da poesia no mercado editorial, os erros e acertos da produção contemporânea.

Lendo as entrevistas, é interessante notar tanto interseções como divergências em relação às respostas dos entrevistados.

Álcir Pécora mostra-se mais cético e crítico em relação à literatura brasileira contemporâne e não aposta em nenhuma tendência ou autor específico, vendo pouca inovação na produção atual. Muito diversa é a perspectiva de Luciana Hidalgo que revela uma visão positiva sobre a grande multiplicidade do campo literário atual e percebe uma abertura maior para autores e editoras. Além disso, a pesquisadora, assim como Luiz Bras, aponta o uso de redes sociais como um fator construtivo para a troca de opiniões e informações sobre a literatura, uma
proximidade maior entre leitores e autores.

Na visão de Manuel da Costa Pinto, não há uma exploração maior das ferramentas da internet, que é vista por ele como apenas mais um meio de divulgação da literatura. Ademais, o crítico literário menciona várias tendências
literárias e nomeia os autores pertencentes a elas, afirmando ainda que oficinas literárias não produzem qualquer tipo de resultado e, por fim, diz que notam-se inovações nas obras contemporâneas, que dão maior ênfase “para o aprofundamento de algumas formas e gêneros que não estavam de todo ausentes na literatura do passado – caso o mini ou micro-contos.”.

As entrevistas estão disponíveis AQUI

Com o link, convido a todos a dividirem suas opiniões e a debaterem a diversidade das facetas da literatura contemporânea.

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A farsa do livro

Débora Molina

A farsa do livro

Há alguns meses, estava eu, sem a menor pretensão, assistindo a um canal qualquer de televisão, quando me deparei com um dos mais incríveis episódios do The Simpsons.  O episódio 6, da 23ª temporada, intitulado originalmente de The book Job, brinca com um suposto mito sobre a relação do mercado editorial e o processo de autoria dos romances infanto-juvenis. Lisa, a famosa personagem cult, descobre que a autora de sua série favorita de livros é uma farsa: uma atriz contratada para se fazer passar pela autora apenas durante as fotos de divulgação dos livros da série.

Através do humor ácido, um mundo sobre o mercado literário é descrito: os livros são planejados com base em pesquisas de mercado e a escrita é ‘fabricada’ por um grupo de especialistas em literatura, viciados em remédios e loucos por um emprego. Decepcionada, Lisa retorna para casa e ao conversar com Homer sobre o crime perfeito arquitetado por editoras que apostam na contratação de ghost writers para produzir best sellers, inspira o pai a formar uma equipe para escrever um livro e faturar um milhão de dólares. A decepção de Lisa também a inspirou a escrever seu próprio romance à maneira dos “grandes autores”, segundo a personagem.

Bastante satírico, o episódio nos possibilita observar duas imagens ambivalentes sobre a concepção de autoria:  de um lado Homer monta uma equipe para escrever um livro, de outro, Lisa sofre para escrever a primeira linha do seu romance. Lisa encarnando uma caricatura do velho escritor romântico à espera da inspiração para a escrita de sua obra prima, perambula por cafeterias, busca ouvir boas músicas, procrastina o quanto pode o momento da escrita, já que as palavras não vêm.

O episódio segue com base em uma paródia ao filme “11 homens e um segredo”. Homer monta uma gang de “autores” e conta com a participação do famoso escritor americano de Best-sellers Neil Gaiman, que no episódio não sabe escrever. Em oposição à imagem romântica associada à autoria, ao autor gênio cheio de inspiração, a figura do autor aqui é subvertida: no lugar do autor, uma equipe de produção, substituindo o trabalho com a escrita, a fluidez de um trabalho quase mecânico realizado por uma equipe.

O episódio também tematiza a participação ostensiva dos editores na elaboração do romance, o desejo de estrelato dos autores, a construção dos gostos do público. Tendo terminado o livro, a equipe de Homer tenta vendê-lo para uma grande editora, mas, para receber o almejado dinheiro, a gang da escrita precisava de um front-man, de um nome para a capa. A reviravolta sarcástica consiste em que o papel de autor é oferecido para Lisa, que concorda com a proposta mesmo contrariando seu ideal de autoria.

Depois de assinado o contrato milionário, Lisa tem crises de consciência por ter aceito se tornar uma “fraude literária”, mas ainda há mais: o livro é completamente modificado. Ao questionar o editor sobre a mudança, Homer ouve como resposta que as modificações foram feitas de acordo com pesquisas de gosto do público.

Este episódio nos convida a pensar sobre as modificações do campo Literário e as reviravoltas em torno da concepção da autoria e da própria literatura no século XXI.

Assita o episódio completo Aqui!